Gouveia e Melo é visivelmente uma daquelas pessoas que se tem, a si próprio, em grande conta – algo, aliás, em que o nosso país é pródigo, tais os figurões que, por uma razão ou outra, se julgam insubstituíveis. O almirante, antes de camuflado, agora, desde que é ‘patrão’ da Armada, já mais pomposa e alvamente fardado, desdobra-se em entrevistas, declarações, “ons”, “offs”, conferências de imprensa e sei lá mais o quê. Um certo país, sempre pronto a adular esses sucedâneos daquela famosa ‘prima do Solnado’, aquela que, segundo o próprio, “gostava de dizer coisas”, rejubila com a farda e o ar e tom sebastiânicos, ou como se de uma reencarnação do general Ramalho Eanes se ratasse. Eu, pela minha parte, confesso, estou a começar a estar um bocadinho farto. De quê? Do almirante, da farda, das declarações, daquele sentimento de “indispensabilidade” que quer(em) transmitir, dele pisar constantemente a “fronteira” do que é a sua missão. Lembro-me, como se fosse hoje, de uma frase do almirante, numa entrevista há coisa de um ano e tal, estava ele no auge daquela sua missão de compor e organizar uma tabela de vacinação, dizer qualquer coisa como isto: “Como não me canso, torno-me cansativo”. Aí, sim, estamos definitivamente de acordo.
Se estou bem lembrado, uma das primeiras iniciativas mediáticas de Marcelo Rebelo de Sousa enquanto Presidente da República foi chamar a atenção para os sem-abrigo. Se a memória não me atraiçoa, Marcelo teria mesmo então avançado uma data-limite para que fossem retirados da rua os mais de 8 mil que se dizia existirem na altura e que, usando uma expressão sua, deveriam ser rapidamente ‘realocados’ com as óbvias necessárias condições de dignidade. Passaram-se, desde aí, 6 ou 7 anos, e esses 8 mil devem hoje ser talvez o dobro. De vez em quando, como há dias em Arroios, o nosso Presidente lembra-se do seu compromisso, que tarda em ser cumprido, e lá protagoniza um daqueles seus habituais ‘números’, correspondidos quase sempre por uma qualquer autarquia ou uma santa casa da praxe a garantir que irá pontualmente resolver a situação. Das duas, uma: ou Marcelo vai, um a um, ter com todos os sem-abrigo que existem em Portugal, esperançado que o seu ‘alerta’ sirva para alguma coisa, ou então começa a ser altura de reconhecer que o compromisso assumido não passou de uma daquelas ‘performances’ mediáticas de que o País começa também a estar farto.
Há dez anos, uma lei do governo de Pedro Passos Coelho reduziu o número de freguesias de 4.259 para as atuais 3.092. Três anos depois mudou o governo e, bem ‘à portuguesa’, a nova maioria resolveu anunciar a reversão da lei, afirmando partilhar o sentir de cerca de 500 freguesias que gostariam de ser desagregadas. Até agora, quando falta apenas pouco mais de um mês para terminar o prazo, afinal apenas 9 das 1.167 freguesias agregadas em 2012 requereram a reversão da medida. Palavras para quê?