DIRECTOR: MANUEL CATARINO  |  FUNDADOR: JOAQUIM LETRIA

Ai que se lhe acaba a mama!

O Ministério Público que saber por que raio o major-general Carlos Chaves anda a passear-se pelo país fora, até aos domingos, ao volante de um automóvel da Câmara de Cascais. Querem ver que lhe vão tirar o carrinho…
Repórter T&Q

O major-general Carlos Chaves, acolhido na Câmara de Cascais após uma carreira sempre muito próxima dos corredores do poder, tem oficialmente a tarefa de assegurar a ligação do património militar do concelho à autarquia. Tem direito a um carro de uma empresa municipal. Mas não há sequer um simples contrato de prestação de serviços. É tudo informal e de trinta e um boca entre o general e o generoso presidente Carlos Carreiras.

A mama do carrinho da Câmara para todo o serviço, até para as passeatas de fim-de-semana pelo país fora, vai acabar. O Ministério Público acaba de notificar a Câmara para responder a uma simples pergunta: a que título o major-general Carlos Chaves se serve diariamente do carro como se fosse seu?

Chaves é conhecido no meio castrense por ter passado de tenente a coronel com escassos dias de quartel, sempre muito chegado ao poder. Uma carreira construída nos gabinetes que o tornou conhecido como o mais civil dos militares.

O ponto alto desta trajetória sem brilho foi ter servido, enquanto capitão e major, nos anos 90, às ordens do ministro Fernando Nogueira no Ministério da Defesa. O fim do cavaquismo deu-lhe guia de marcha, já com as divisas de tenente-coronel, para um confortável lugar de adido militar da nossa Embaixada em Paris — donde regressou, em 2002, sem deixar saudades. A pátria promoveu-o a coronel e Chaves pôde finalmente comandar um regimento — o de Infantaria 14, em Viseu –, missão indispensável para alcançar o generalato. Um ano depois, aí estava ele no Instituto de Altos Estudos Militares, e foi com mediano aproveitamento que fez o curso de Comando e Direção. Terminou a carreira na GNR, com as estrelas de major-general nos ombros, sem que lhe fosse atribuído qualquer cargo operacional.

Os ventos da política, com a derrocada de Sócrates e a chegada de Passos Coelho, trouxeram-lhe em 2011 o habitual cheirinho do poder. Uma oportuna cunha do antigo ‘patrão’ Fernando Nogueira abriu-lhe as portas do gabinete do novo primeiro-ministro — que o nomeia assessor para a segurança nacional. Uma das suas tarefas era assegurar a ligação entre o chefe do Governo e os serviços de informações. Mas o major-general Chaves, conflituoso e viperino, rapidamente se tornou ‘persona non grata’ entre os que trabalhavam com ele e, principalmente, no seio das ‘secretas’. Passos Coelho, farto das inconveniências de Chaves, extinguiu o cargo e pô-lo a andar. Valeu ao major-general a mão amiga do ministro da Defesa, Aguiar Branco, que o nomeia para uma recém-formada Comissão de Acompanhamento da Reforma Militar — um encosto à medida de quem gosta da intriga.

Chega a ´Geringonça’. O nosso general não sabe o que o Governo pretende fazer com ele. Solicita uma entrevista ao novo ministro da Defesa, Azeredo Lopes — que se recusa a recebê-lo. Escasso dias depois, sem dizer água vai, o ministro extingue a Comissão de Acompanhamento da Reforma Militar. Carlos Chaves fica sem tacho. Mas uma providencial cunha de Fernando Nogueira, mais uma…, leva-o para a Câmara de Cascais. O lugar não tem o penacho e o brilho de outrora. Apenas um telemóvel e um carrinho às ordens, nada mau nos tempos que correm.

E foi precisamente o carro da Câmara de Cascais que o denunciou, há pouco mais de um ano, no conhecido restaurante Vidal, em Águeda. Chaves, um impenitente desbocado, resolveu atingir com os seus excessos verbais um menino de seis anos, Miguel, autista.

Segundo contou aos nossos repórteres o pai da criança, o jurista Luís Osório, o incidente deu-se na fila para recolher o leitão previamente encomendado: “O Miguel estava cansado de esperar e pediu-me para ir embora. Ao meu lado, estava um senhor de meia-idade que começou a dar sinais de desconforto com as queixas do meu filho sobre a demora e, sem que ninguém tivesse falado com ele, virou-se para mim e disse-me: ‘Estou aqui há mais tempo, não fui atendido e estou calado’”. Luís Osório recordou que ainda tentou explicar ao irascível Chaves que o filho, por ser autista, era menos impaciente que os demais. A resposta do general foi de nível: “Tivesse pensado nisso antes de sair de casa”.

Luís Osório perdeu as estribeiras — e arrancou na direção do general. “Perdi a cabeça, a compostura e a educação. Confesso que ver aquele ser vivo, com idade para ser avô do Miguel, a referir-se a ele como um animal que devia ficar fechado em casa, me deixou tresloucado”, disse Luís Osório. Chaves, não fosse o pai do menino chegar-lhe a roupa ao pelo, esgueirou-se pelo parque de estacionamento, sem esperar pelo leitão, e pôs-se rapidamente em fuga ao volante de um carro que, mais tarde, identificou como propriedade da Câmara de Cascais.

Luís Osório deu conhecimento da ‘cena macaca’ ao presidente da autarquia — que aceitou recebê-lo. “O presidente mostrou-se sensível com o Miguel. Mas disse-me que nada podia fazer. Se eu me sentia ofendido, que fosse para os tribunais”, recorda Osório. Da parte do general, nem um singelo pedido de desculpas. “Também lamento que o dinheiro dos contribuintes esteja a ser gasto por um homem insensível que ao domingo vai passear de Cascais a Águeda num carro que pertence a todos nós”, diz Luís Osório.