Vá lá saber-se porquê, mas há muito que Carlos Moedas estava convencido de que existia um acordo para que o governo articulasse com a Câmara Municipal de Lisboa a nomeação da Mesa, leia-se administração, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML). E até já tinha na manga o nome que iria indicar para assumir um cargo na vetusta instituição do Largo da Misericórdia – o de António Valle, o seu quezilento chefe de gabinete.
O facto de em 2011, quando foi nomeado provedor da Santa Casa pelo governo de Passos Coelho, Pedro Santana Lopes ter acedido à pretensão de António Costa, então presidente da Câmara de Lisboa, de integrar na equipa um nome sugerido pelo autarca, levou Moedas a pensar que, dez anos depois, existia um entendimento formal nesse sentido, ou seja, que a edilidade alfacinha tinha direito, no mínimo, a indicar um nome para a Mesa da instituição.
Só que, pelos vistos, Costa resolveu pura e simplesmente marimbar-se para o que Moedas podia supor, e sem lhe dar qualquer cavaco nomeou a nova equipa dirigente da SCML, que a ex-ministra da Saúde Ana Jorge irá liderar, pelo menos, nos próximos três anos.
Moedas ficou à beira de um ataque de nervos, até porque já tinha decidido há alguns meses empandeirar o seu chefe de gabinete, António Valle, cujo estilo belicoso lhe tem criado alguns dissabores na gestão da capital. E o lugar na administração da Santa Casa, uma espécie de ‘recuo estratégico’, assentava que nem uma luva a Valle, quanto mais não fosse porque dificilmente seria entendido como uma despromoção, algo que ocorreria se o seu braço-direito fosse ‘chutado’ para alguma das cinco empresas municipais de que Lisboa dispõe, como normalmente sucede na edilidade da capital.
Cautela e caldos de galinha…
Há muito que é conhecida a intenção de Moedas de substituir o chefe de gabinete, a ponto de o autarca já ter, pelo menos, convidado (ou no mínimo, sondado) duas pessoas para substituir Valle. Conhecendo o seu chefe de gabinete como conhece, Moedas sabe bem que não o poderá tratar tal e qual como um ‘kleenex’, daqueles que se usam e deitam fora – nada disso…
Quanto mais não seja porque Moedas sabe que só teria a perder se Valle inscrevesse o seu nome na longa lista de desafetos, isto por um lado. Mas por outro, porque lhe tem uma dívida de gratidão, dado Valle ter sido um dos poucos que, mesmo com as sondagens a vaticinarem-lhe uma pesada derrota frente a Fernando Medina, nunca o abandonaram: “Na campanha, o Valle agarrou-se a Moedas como uma lapa, talvez não só por convicção, mas também porque estava ‘pendurado’ desde que participara na campanha interna de Luís Montenegro”, lembrou ao Tal&Qual alguém que acompanhou a par e passo a caminhada de Moedas até à praça do Município.
Mas existe uma outra razão para Moedas trazer Valle nas palminhas: ele sabe bem que o seu inseparável braço-direito ser-lhe-á essencial, se porventura se abalançar para outros voos, leia-se na corrida à liderança do PSD, lugar que espreita praticamente desde o dia em que conquistou a autarquia da capital: “Moedas vê a Câmara de Lisboa como um mero trampolim para vir a ser líder do partido, é só isso que o move, não faz rigorosamente nada sem ser a pensar nisso”, confidenciou ao T&Q um destacado dirigente social-democrata.
Ao longo do tempo em que trabalhou com Miguel Relvas, e mesmo mais tarde, quando passou pelo gabinete de Pedro Passos Coelho, Valle foi somando preciosos contatos pelo país fora, o que o faz hoje ser alguém bem-relacionado no universo laranja. E um lugar na Mesa da Santa Casa cairia que nem sopa no mel para quem queira dispor de tempo para estruturar um hipotético ‘assalto’ à liderança do PSD. Ainda não foi desta…