Às vezes, quando estou a regar as plantas do terraço de minha cobertura, no Leblon, aqui no Rio, lembro-me de Sarita Montiel. Sabe quem foi? Foi uma atriz e cantora espanhola, famosíssima mundialmente em fins dos anos 50, quando sua beleza siderava as plateias em filmes como ‘A última canção’, ‘Carmen de Ronda’ e, principalmente, ‘La violetera’.
Nós, os garotos que víamos Sarita no cinema, nos cartazes dos filmes e nas capas das revistas ou dos LPs, perdíamos o sono pensando em seus olhos verdes, cabelos castanhos, lábios carnudos e, principalmente, em seu decote — os adolescentes não são muito espirituais em suas fixações. Por Sarita, e apenas por ela, ficávamos até o fim daqueles horríveis filmes espanhóis, gemendo de inveja dos galãs que a beijavam e rezando para que, ao cantar, ela arfasse ao tentar certas notas e seu decote revelasse mais um pouco do que pareciam duas pequenas obras-primas.
O apogeu de Sarita foi entre 1958 e 1962, quando ela tinha 31 ou 32 anos e, na minha memória, nunca envelheceu nem um dia. Os Estados Unidos a ignoravam, mas ela tinha a Europa, o México e a América do Sul aos seus pés. E, quando digo que Sarita nunca passou dos 31 ou 32 anos, é porque, a partir dali — começando talvez por ‘Meu último tango’ ou ‘A Rainha do Chantecler’ —, atrevemo-nos a trocá-la por paixões mais próximas e palpáveis. Quem sabe sentindo-se traída, ela foi saindo da tela aos poucos e, com isso, poupou-nos de a ver envelhecer.
Mas, no auge do estrelato, talvez em 1962, Sarita veio ao Rio, e deram-lhe uma festa. Ivan Lamounier, presidente da distribuidora Condor, que lançava os seus filmes, abriu o terraço de sua cobertura no Leblon e convidou meio mundo. Todo o pessoal do cinema brasileiro compareceu. A noite era de lua cheia e o mar refulgia lá embaixo. Uma pequena orquestra fornecia a música, e o implacável galã nacional Anselmo Duarte, grande conquistador, tirou Sarita para dançar. Enlaçou-a e a levou para um cantinho escuro do terraço. Terá nascido ali um romance?
Bem, se o romance aconteceu, não sei. Só sei que, ao regar as plantas à noite no mesmo terraço, onde hoje moro, posso ver Sarita e Anselmo dançando ao luar e me surpreendo gemendo de inveja dele.